Semelhanças com o passado
Estado Novo versão soft
ZÉ D'ALBUFEIRA d.r.
No outro tempo, sentávamo-nos na Casa Inglesa (**) e logo os bufos se acercavam de nós discretamente para escutar as conversas e espiar o que líamos. Ou, à porta do cinema (**), registavam visualmente (e com fotos) os rostos de quem saía dos comícios da Oposição Democrática em período de campanha para as eleições ditas «livres» com que Salazar e Caetano periodicamente encenavam um «Estado de Direito», que não existia. Era o Estado Novo. O tempo da toda poderosa PIDE de má memória.
Não havia, nem pouco mais ou menos, os meios sofisticadíssimos que as secretas hoje utilizam para devassar as nossas vidas, as famílias e as instituições. Mas há inegavelmente enorme semelhança – nos princípios e nas ações.
Hoje como então, os cidadãos são despudoradamente, diria mesmo criminosamente, vigiados, chantageados e perseguidos. Os torcionários desse outro tempo de um Portugal amordaçado, tal como a miserável censura, que controlava por completo a opinião pública e publicada, têm hoje lídimos representantes nas secretas, nos partidos e nos próprios gabinetes ministeriais, como está amplamente demonstrado. Cujo exemplo mais recente é o já tristemente célebre – e ainda a procissão vai no adro – escândalo Silva Carvalho/Miguel Relvas, que está a abanar fortemente os alicerces do poder democrático, quiçá, a própria Democracia.
Esta triste realidade, aliada à crescente e assustadora corrupção instalada a todos os níveis do poder até ao tutano, à desgraça económica e financeira a que impunemente nos conduziram e à incompetência e irresponsabilidade que grassa entre governantes, quer internamente quer no âmbito da decadente União Europeia, só nos pode conduzir para abismos de imprevisível dimensão, obviamente com resultados imprevisíveis. E implacáveis.
É caso para perguntar: para onde caminha Portugal?
(Minha coluna de opinião "Antes do mais" no «barlavento» de hoje, 31/05/2012)
*foto "DN"
**Portimão 1965/73